Item 0133 - Aos Camponeses / Ricardo Mella. - [Lisboa] : Hilario Marques, 1910. - (Biblioteca de A Sementeira)

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Código de referência

PT-AHS-ICS-PQ-B-0133

Título

Aos Camponeses / Ricardo Mella. - [Lisboa] : Hilario Marques, 1910. - (Biblioteca de A Sementeira)

Data(s)

  • 1910 (Produção)

Nível de descrição

Item

Dimensão e suporte

1 brochura; papel

Zona do contexto

Nome do produtor

(1861-1925)

História biográfica

Anarquista espanhol.

Nome do produtor

(1908-1919)

História administrativa

Dados editoriais
Em linha com a agitação política e social provocada pelo regicídio de Fevereiro de 1908, a propaganda anarquista começou a intensificar-se, continuando o impulso iniciado anos antes com a publicação de uma série de revistas que, contudo, tinham conhecido uma existência efémera. Depois do desaparecimento da Revista Livre, de Campos Lima, e da Luz e Vida, de Ângelo Jorge, o espaço doutrinário foi ocupado pelo periódico Novos Horizontes, cujo primeiro número foi editado em 1906. No entanto, a revista de propaganda e crítica também teria vida curta e findaria a sua publicação em Maio de 1908. Só com o surgimento de A Sementeira, em Setembro de 1908, é que o anarquismo português passou a contar com um órgão duradouro e com a coerência teórica necessária para se entregar à tarefa de propagandear a Ideia.

A aventura editorial de A Sementeira iniciou-se antes do lançamento do primeiro número da revista. Em 1906, o arsenalista Hilário Marques tinha já sido o principal animador do grupo Acção Directa - responsável pela edição de brochuras de Malatesta, Cláudio de Lisle e Kropotkin -, que se viria a dissolver no grupo editor de A Sementeira, dois anos depois. O nascimento da publicação mensal ilustrada de crítica e sociologia dava o seguimento natural a esta empresa e aproveitava a desocupação do espaço destinado à imprensa de orientação anarquista, após o desaparecimento da Novos Horizontes, para iniciar um trajecto de mais de uma década.

O principal dinamizador da revista foi o próprio Marques, proprietário de A Sementeira, coordenador do projecto e director durante toda a sua existência. Nestes encargos administrativos, foi auxiliado pelo tipógrafo Lima da Costa, que, ao que tudo indica, terá sido não só o responsável pela composição gráfica da revista, como um importante suporte na sua direcção durante o primeiro período em que Hilário foi forçado a deslocar-se para Glasgow, com o propósito de fiscalizar a construção de propulsores de dois contratorpedeiros que estavam a ser construídos no Arsenal da Marinha, entre 1911 e 1912. As tarefas editoriais foram desempenhadas pelo farmacêutico Ismael Pimentel a partir do n.º 27, de Novembro de 1910, que também colaborou activamente na elaboração de artigos doutrinários, sob o pseudónimo de Ismaelita. Mas a primeira série de A Sementeira ficou ainda marcada pela importante actividade redactorial de Gregório Nazianzeno de Vasconcelos, regressado do Brasil no final de Abril de 1911, e que de imediato se envolveu na feitura da revista. Sob os pseudónimos Zeno Vaz, Fernan-Vaz e, claro, Neno Vasco, colaborou em 20 dos 22 números publicados entre Maio de 1911 e Fevereiro de 1913, data que marcou o fim da primeira série, após uma série de 52 meses de publicação, apenas interrompida entre Agosto e Outubro de 1911 e Janeiro e Março de 1912.

O primeiro interregno da edição de A Sementeira pode ter sido instigado pela instabilidade naturalmente provocada pela partida do seu director para Glasgow, poucos meses antes. A interrupção serviu, porém, para definir a descontinuação da paginação iniciada no primeiro número e a preparação do primeiro volume da revista, que foi constituído pelos seus primeiros três anos. Com o n.º 37, deram-se alterações importantes na revista: a paginação reiniciou-se e o preço avulso baixou para metade, de 40 para 20 réis. Esta diminuição de valor deveu-se, provavelmente, à decisão de terminar a publicação dos suplementos ilustrados que acompanhavam os artigos biográficos das páginas centrais de cada número.

A segunda intermissão ficou a dever-se à violência policial exercida sobre os militantes avançados, logo após a greve geral de Janeiro de 1912. Os editores e redactores da revista foram impedidos de publicar o n.º 41 atempadamente, mas da convulsão social provocada pela paralisação operária e pela consequente repressão governamental nasceu uma nova iniciativa de propaganda, que se iria desenvolver a partir da sede administrativa de A Sementeira. Com o fortalecimento das afinidades entre Neno Vasco, recém-chegado a Lisboa, e Lima da Costa, durante o movimento grevista, surgiu a intenção de se iniciar a publicação de um conjunto de panfletos anarquistas e sindicalistas. De um contexto reivindicativo nasceu o grupo A Brochura Social, que iria ter um papel importante a desempenhar alguns meses mais tarde, durante o período em que a revista esteve suspensa.

Após o retorno a Lisboa do seu fundador, no final de Abril, A Sementeira depara-se com problemas de financiamento, devido ao constante atraso no pagamento das assinaturas. Apesar dos apelos que foram lançados nas páginas da revista, esta questão continuaria e seria uma das causas para a sua suspensão, em Fevereiro de 1913. Mas não se tratou da única razão: o regresso de Hilário Marques revelou-se temporário, voltando a Glasgow em meados de Março, devido aos seus compromissos profissionais. Sem o seu principal animador e com o provável afastamento de Lima da Costa, que se terá incompatibilizado com Neno Vasco por causa da administração deficiente de A Brochura Social, a revista foi interrompida após 52 números publicados, uma colecção completa de 292 páginas e outra incompleta de 128.

Sem a publicação de A Sementeira, a actividade editorial do seu grupo estagnou, com a excepção da publicação de duas brochuras. Em 1914 editou-se o panfleto de Landauer sobre A Social Democracia na Alemanha e no ano seguinte é lançado Em tempo de eleições, de Malatesta, cuja primeira edição tinha sido obra do grupo Acção Directa. Assim, a acção propagandística foi garantida pelo grupo A Brochura Social, que em Junho de 1914 apresentou uma tese sobre a relação entre anarquistas e movimento operário na Conferência Anarquista da Região Sul. Com a saída de Lima da Costa, as tarefas de administração começaram a ser desempenhadas por Aurélio Quintanilha, com o auxílio do advogado Sobral de Campos. O curto catálogo editorial do grupo leva a crer, contudo, que essa gestão também não foi bem sucedida e o grupo desintegrar-se-ia nesse mesmo ano. Entretanto, vão surgindo as primeiras notícias que dão como inevitável o ressurgimento de A Sementeira, mas tal só viria a confirmar-se em Janeiro de 1916.

Com o relançamento da revista, a equipa administrativa manteve-se unida: ao lado do director Hilário Marques, regressado de Glasgow, continuava Pimentel, com funções editoriais. O preço de 2 centavos (20 réis antigos) permanecia o mesmo do final da primeira série, mas este seria um dos poucos elementos intocados para o início da nova série. A principal alteração fez-se sentir no formato de A Sementeira, que reduz os 22x33 cm para 16x25 cm, aumentando as 8 páginas por número para 16. Com o início da nova série, a redacção e administração abandonaram a antiga casa do director, o "cacifo" na Rua da Barroca, onde se instalaram no início de 1909 (depois de uma curta passagem pelo 1º andar do 44 da Rua das Salgadeiras), deslocando-se para a taberna Feijão Encarnado, no Cais do Sodré, onde permaneceram até Agosto de 1919, quando a revista cessou a sua actividade. Também a impressão deixou de se efectuar na tipografia A Publicidade, na Rua do Diário de Notícias, passando a realizar-se numa oficina situada na Rua do Poço dos Negros, n.º 81, onde também era composto o Germinal.

Todavia, no dealbar de 1916, o contexto económico e político não parecia beneficiar a continuação desta aventura editorial. As finanças da revista continuavam numa situação bastante difícil e dependiam do pagamento atempado das assinaturas, dos donativos das comunidades de emigrantes em New Bedford e no Brasil e do provável apoio do grupo Aurora Social, que editou A Aurora, no Porto, e com quem Hilário Marques sempre manteve uma relação muito próxima. Também a carestia do papel, provocada pela Grande Guerra, contribuiu para que o preço unitário da revista aumentasse para 3 centavos, a partir do n.º 25, de Janeiro de 1918, número no qual é reiniciada a paginação. Desta forma, fechava-se a terceira colecção de A Sementeira, que correspondia aos últimos dois anos de publicação, com um total de 384 páginas. Esta solução serviu, muito provavelmente, para aumentar as receitas do grupo editorial, através da venda ao público de um volume com índice e ainda com uma encadernação cuidada.

As dificuldades da edição também eram notadas nos conteúdos publicados, tanto pela colaboração mais irregular de Neno Vasco, como pela frequência com que se encontravam espaços vazios na revista, entre Maio de 1916 e Junho de 1917. Era a censura a fazer-se sentir sobre um periódico de cariz anti-intervencionista. A supressão de 9 páginas e meia do número que estava previsto sair em Novembro de 1918 foi a causa apresentada pelo editor para justificar a interrupção da publicação entre Outubro e Fevereiro de 1919. Só após a abolição da censura é que A Sementeira reapareceria, procedendo a alterações no corpo editorial: Pimentel foi afastado das suas funções por alegadamente ter alinhado com fregueses monárquicos da sua farmácia nas críticas ao regime republicano. Marques passava a acumular o cargo de director com o de editor até ao derradeiro número da revista, que chegou de forma imprevista e sem aviso em Agosto. Os n.ºs 25 a 41, que totalizavam 272 páginas, foram encadernados para a quarta e última colecção deste periódico.

Com o fim definitivo desta publicação, Hilário Marques dedicou-se ao jornal operário que tinha ajudado a fundar em Fevereiro. Tratava-se de A Batalha, à época órgão na imprensa da União Operária Nacional. O trabalho propagandístico de A Sementeira continuou, publicando cinco brochuras entre 1919 e 1923, muito provavelmente pelo esforço solitário do seu grande animador, que já não pôde contar com a ajuda de Neno Vasco para a realização dessa tarefa. A revista já não regressaria, pois o espaço doutrinário fora já ocupado pelo diário que iria marcar a orientação do anarquismo português na década seguinte. A década anterior, porém, definiu-se nas páginas da revista dinamizada pela impressionante energia de Marques. Foi este invulgar ânimo do arsenalista que fez de A Sementeira o periódico de maior duração e prestígio, quando comparado às demais revistas anarquistas do seu tempo.

António Baião

Breve Notícia Sobre a Trajetória de A Sementeira
Em setembro de 1908 salta do prelo o primeiro número de A Sementeira. Na primeira página, encimado pelo título, “Ao aparecer”, o texto de apresentação não deixava dúvida sobre a missão da “Publicação Mensal Ilustrada – Crítica e Sociología”. O parágrafo esclarecia que:
“A Sementeira, aeroplano de idéas, voando por cima de todas as mentiras economicas, politicas e religiosas, na sua missão evangelisadora, através de todos os obstaculos que se lhe deparem, não sairá do fim a que vem destinada: propagar idéas, definir principios, esses principios tantas vezes deturpados e que sempre pairaram por cima de todas as miserias cerebraes de muito propagandista popular, principios defendidos e propagados pelos Reclus, Kropotkine, Grave, Malato, Malatesta, Ibsen, Hamon, etc., princípios que nos conduzirão indubitavelmente a uma sociedade nova, livre e do Bom-Acôrdo.”

A publicação nascia lisboeta e seu proprietário e editor era o arsenalista Hilário Marques. Para a execução do projeto gráfico, produção textual e traduções envidam esforços importantes anarquistas da época. Entre eles nos parece útil destacar Neno Vasco, Ismael Pimentel, José Luís, Emílio Costa, Bento Faria, César Porto, Adolfo Lima, Sobral de Campos, Campos Lima, José Carlos de Sousa, Bel-Adam (pseudônimo de Severino de Carvalho) e ainda outros.

No geral não fica difícil perceber que A Sementeira caracteriza-se antes pela divulgação da doutrina anarquista, sua propaganda, com ênfase na interpretação dos fatos nacionais e internacionais analisados por esse prisma. As muitas notas biográficas, bem como as traduções e textos de opinião, conjugam-se no esforço de conferir maior nitidez aos princípios ideológicos do anarquismo; sempre no sentido prático da organização, posta a serviço da redenção social de explorados e oprimidos. Percebe-se também a preocupação de inaugurar formas eficazes de disseminar o espirito de rebeldia, um tipo de “erudição radical”, com o qual se possa contar em momentos de ruptura política e social. Ainda que nos volumes apareçam diferentes demandas, de acordo com os influxos e conjunturas, a linha doutrinária sofre pouca descontinuidade. Ela é, de fato, o elemento de identidade da revista.

Os fatos históricos e as efemérides libertárias são tratados dentro da mesma perspectiva, servindo ao mesmo propósito. Não é diferente no caso da iconografia, sempre presente, em alguns números mais em outros menos, mas invariavelmente afinada com o protocolo geral de transformação social. Como muito bem destaca João Freire, as preferências dos responsáveis pelo conteúdo da revista recaem sobre o comunismo anarquista, mais que pelo individualismo ou sindicalismo. Um fato que, de resto, não nos parece incomum naqueles meios onde prevalecia o cuidado com a disseminação da doutrina.

Entre os teóricos, Errico Malatesta aparece com destaque, principalmente depois do retorno de Neno Vasco a Portugal, em 1911. Além de tradutor incrivelmente erudito, Neno Vasco destaca-se também como pensador original, como um dos mais perspicazes homens de doutrina. Das páginas de A Sementeira, ele orienta os anarquistas na difícil tarefa de atuar diligentemente nos sindicatos. Não descuida um momento sequer da tarefa de inserir socialmente a ideologia anarquista. É o mesmo que anima as colunas de teatro, literatura e o cancioneiro revolucionário. Não é menos responsável pela divulgação de brochuras de propaganda, edições anexas, e indicações de livros publicados que circulam na época. Com Lima da Costa, Neno Vasco deu início a um conjunto de publicações intitulado “A Brochura Social” que, a despeito da importância, ainda que com o apoio de Sobral de Campos e Aurélio Quintanilha, não logrou aportar os recursos materiais necessários que garantissem a sua circulação mais efetiva.

A questão operária é, de muito longe, o assunto mais tratado na revista. Sem descuidar das muitas revoltas nas mais variadas latitudes do globo, ainda assim, as greves e o cotidiano laboral são matérias de destaque. Os editores, todavia, não confundem o movimento operário com sindicalismo; fazem a diferença ao enxergarem o sindicalismo como método, apenas. Ainda que bastante influenciada pelo prestígio do sindicalismo revolucionário, principalmente o francês, fica claro que o papel central de A Sementeira é divulgar o anarquismo. Nesse ponto, ainda que com ênfase na doutrina, ela reflete a dualidade libertária típica ao não dissociar as esferas social e política, ao tornar evidente a necessidade de inserção dos libertários no campo da luta social.

Por tudo isso, não foram poupados nas suas páginas os republicanos e toda a sorte de “trânsfugas” do anarquismo. O grupo de editores, constituído pelas figuras aqui destacadas, parecia não reconhecer limites para o combate ao que representasse perigo ao projeto geral de disseminação do ideário. Ainda que sem a coesão de um grupo de afinidades políticas, articulavam-se perfeitamente bem, desenvolvendo uma dinâmica tal que garantiu a continuidade da publicação; uma “informalidade” que pode bem explicar a aproximação de simpatizantes, com destaque para alguns que se ocuparam dos serviços gráficos, garantiram locais de reuniões e ainda mais.

Sobre a circulação da revista cabe dizer que era vendida ao preço unitário, sendo possível ainda, fazer assinaturas. O número de páginas variou com o tempo, bem como o valor. O público interessado podia encontrar A Sementeira em sindicatos, sedes de grupos anarquistas, em kiosques e no comércio de Lisboa, Porto e Coimbra, principalmente. Havia também subscritores no Brasil, em diferentes partes da África e América. Os editores em Lisboa ajudavam ainda a distribuir outras publicações anarquistas que vinham do Norte, como o caso de A Vida e a A Aurora.

No geral pode-se afirmar que A Sementeira esteve sempre no campo da luta revolucionária e social. Foi assim no 5 de Outubro de 1910, como no caso do Outubro da Rússia soviética, em 1917. Foi, no âmbito da Grande Guerra (1914-1918), essencialmente “antiguerrista” e nesse particular acompanhou a corrente internacional encabeçada por Malatesta. Ainda que sem exclusivismos, destacou em suas páginas a preferência comunista anarquista da maioria dos editores. E por tudo isso marcou indelevelmente o movimento libertário de língua portuguesa.

Alexandre Samis

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