O Arquivo Manuel de Lucena contém um conjunto heterogéneo de documentos produzidos e acumulados no decurso das suas actividades científicas e académicas. Destaca-se os projectos de investigação: sobre a extinção dos grémios da lavoura e suas federações (1977-78); o processo português de reforma agrária (1979-1984); os Organismos de Coordenação Económica (OCE) (1977-2015); Interesses organizados e institucionalização da democracia em Portugal (1984-1993?); Descolonização Portuguesa (1995-2003); Investigação sobre corporativismo, coordenação económica e previdência social para entradas no Dicionário de História de Portugal (1977-2000).
Lucena, Manuel de.Marques, Isabel Alexandra Baptista. (2017). "Deixar África 1974-1977 : experiência e trauma dos portugueses de Angola e de Moçambique"
Tese de doutoramento, História (Dinâmica do Mundo Contemporâneo), Universidade de Lisboa, com a participação do ISCTE- Instituto Universitário de Lisboa, Universidade Católica Portuguesa, Universidade de Évora, 2017, https://repositorio.ul.pt/handle/10451/28878
Esta tese propõe-se examinar porque foi o êxodo da descolonização da África portuguesa (iniciado em 1974) sentido e descrito por muitos portugueses que viviam em Angola e em Moçambique como uma experiência psicologicamente dolorosa e procura identificar os factores mais influentes na formulação dos seus sentimentos negativos sobre as consequências deste deslocamento nas suas vidas. Considerando que a partida das colónias representou uma ruptura social e cultural e uma perturbação identitária que causou um trauma transicional nos portugueses radicados que a sentiram como uma ‘amputação existencial’. As crenças, experiências, percepções e estados emocionais relatadas em testemunhos epistolares e institucionais sobre a transição para as independências, o embarque e após a chegada a Portugal permitem assinalar que estas narrativas do êxodo (de memória recente) se fundam em discursos de legitimação, reclamação, vitimização e responsabilização. Os 2 primeiros baseados em crenças, realidades e vivências coloniais como a fixação definitiva, as mitificações luso-tropicalistas, o distanciamento físico e afectivo à metrópole e a forte ligação de pertença e de posse reclamada pelo ‘suor derramado’ e o ‘apego umbilical’ a África. Além do fim de uma realidade de identificação colectiva e de projectos de vida, o ‘sonho africano’ terminou com perdas materiais e danos morais e afectivos geradores de sentimentos de abandono, pânico e indignação. As dificuldades de instalação em Portugal de ordem prática (financeiras e de satisfação de necessidades básicas como alojamento e alimentação) e psicológica (de desajustamento) reforçaram o discurso de vitimização ancorado num sentimento de injustiça e na reclamação numa compensação merecida e acentuaram o de responsabilização dos poderes nacionais, marcado por sentimentos de desconfiança, ressentimento e traição. Após a chegada, estes discursos resultaram do choque causado pelo anátema da sua categorização de ‘retornados’, à época associada a preconceitos estereotipados, da relação conflitual com os residentes e da sua perspectiva judicativa e acusatória sobre o processo de descolonização.